quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Ética, Moral e Shakespeare

Sejamos éticos mas não sejamos tolos.

As tragédias de Shakespeare são todas cheias de discussões morais e éticas, onde as personagens chegam a ter reflexões esquizofrênicas em torno destas questões. Isto numa época em que certas infrações mudavam as pessoas, onde o remorso (do latim remordere: morder de novo) imperava sobre o ego, no caso de atos extremos.



"To be or not to be, thats's the question." É a mais famosa discussão ética citada por Hamlet o príncipe da Dinamarca:


"Ser ou não ser, eis a questão: será mais nobre
 Em nosso espírito sofrer pedras e setas
 Com que a Fortuna, enfurecida, nos alveja,
 Ou insurgir-nos contra um mar de provações
 E em luta pôr-lhes fim? Morrer... dormir: não mais.
 Dizer que rematamos com um sono a angústia
 E as mil pelejas naturais - herança do homem:
 Morrer para dormir... é uma consumação
 Que bem merece e desejamos com fervor.
 Dormir... Talvez sonhar: eis onde surge o obstáculo:
 Pois quando livres do tumulto da existência,
 No repouso da morte o sonho que tenhamos
 Devem fazer-nos hesitar: eis a suspeita
 Que impõe tão longa vida aos nossos infortúnios.
 Quem sofreria os relhos e a irrisão do mundo,
 O agravo do opressor, a afronta do orgulhoso,
 Toda a lancinação do mal-prezado amor,
 A insolência oficial, as dilações da lei,
 Os doestos que dos nulos têm de suportar
 O mérito paciente, quem o sofreria,
 Quando alcançasse a mais perfeita quitação
 Com a ponta de um punhal? Quem levaria fardos,
 Gemendo e suando sob a vida fatigante,
 Se o receio de alguma coisa após a morte,
 _Essa região desconhecida cujas raias
 Jamais viajante algum atravessou de volta –
 Não nos pusesse a voar para outros, não sabidos?
 O pensamento assim nos acovarda, e assim
 É que se cobre a tez normal da decisão
 Com o tom pálido e enfermo da melancolia;
 E desde que nos prendam tais cogitações,
 Empresas de alto escopo e que bem alto planam
 Desviam-se de rumo e cessam até mesmo
 De se chamar ação."


(Ato III, Cena I)

A questão era matar ou não matar seu tio Cláudio que matara seu pai e casara com sua mãe, tomando o trono de Rei? Quais seriam as consequências para si próprio, para sua mãe, e para o país regido por seu tio? Aqui entra a causa da pena de morte.

Ela liberta a sociedade de imediato de um criminoso, mas o que há por detrás da morte? Sem remissão há a possibilidade de retorno deste espírito inferior à Terra? Sendo assim apenas poupamos uma geração, ao passo que a próxima cairá nas mãos sedentas de sangue do mesmo. Caso não haja retorno, não incorremos em culpa de morte, nós que praticamos o assassínio do criminoso, não só os que cometeram o ato em si, como os coniventes à esta pena?

A morte é um bálsamo que o pior dos criminosos não merece. Enquanto nós permanecemos sofrendo as agrúrias da vada, eles caem no nada, num plano superior, ou segundo plano, ou onde quer que seja? Certamente é melhor que aqui... Ah não!

Um poema de Camões, mostra uma atitude bastante comum a época em que foi escrito, mas cada vez menos presente no mundo contemporâneo; onde  o desconcerto é permanente:

Ao desconcerto do Mundo

Os bons vi sempre passar
No Mundo graves tormentos;
E pera mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar

Em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado.
Assim que, só para mim,
Anda o Mundo concertado.



          Luís de Camões




"A vida é um caminho sombrio; uma peça pobre que nos expõe e nos aflige, por hora, sobre o palco. E então é dito sem mais: a vida é uma lenda contada por um idiota cheio de som e fúria, e que não significa nada!"
(Macbeth Ato V, Cena V)
 
Outra conclusão de quem pensa sob o ponto de vista externo. Quando o movimento vem de fora pra dentro, baseada na opinião alheia, a depressão nos leva a conclusão acima. A vida não tem validade alguma. Geralmente pensamos que tudo que faz sentido pra nós e que é indiferente aos outros, por esse motivo, não tem impôrtância. Daí incorremos no erro de não nos autovalorizar, e ninguém acha sentido numa vida onde apenas os outros podem, sabem e tem; e nós se nos julgarmos no direito de querer o mesmo, somos tidos como egoístas, imorais, egocêntricos entre outros valores degradantes da sociedade.  
 
Ética caminha ao lado da hipocrisia. Uma pode ser tomada pela outra, na medida que for conveniente a certos interesses. No mais, "prudência e canja de galinha não faz mal a ninguém", quanto maior a necessidade de se passar lição de moral de um indivíduo, mais duvidosa é sua própria moral. Mais hipoócrita é seu juízo ético.