segunda-feira, 25 de junho de 2012

Ser professor






O primeiro livro que li na vida foi um romance de Érico Veríssimo chamado Música ao Longe e a história era narrada por Clarissa, uma professora do curso elementar, ou pré-primário; foi meu primeiro referencial de professora. Logo o conceito saiu dos livros para a vida real, e embora parte do romantismo tenha permanecido neles, outros professores e professoras surgiram.
Cursei o fundamental e o médio em contato com personas especiais, alguns fascinantes! Tive ainda a sorte de cursar um técnico com o melhor time de mestres possível e imaginável. De onde prematuramente deduzi que era daí para melhor, que quanto maior o grau de ensino, melhor a qualidade dos queridos professores. Será?
Aprendi que a interpretação dos fatos por um único ponto de vista gera falácia ou injustiça. A soma das partes não corresponde ao efeito do todo em conjunto, já diria o conceito de sinergia. Mesmo assim, pelo que vejo e ouço, não dá para permanecer totalmente indiferente.
O grau aumenta, mas as circunstâncias embotam-se, tanto faz o local onde atuam os professores do topo da hierarquia, tanto eles próprios estão meio mumificados em suas consciências, quanto a paisagem tornou-se concreta. No ano de 1977, Mario Quintana, poeta apresentado a mim por uma dessas professoras fascinantes que ainda existiam até aqui, escreveu em seu livro A Vaca e o Hipogrifo, o seguinte Poema:   

Oh! Aquele menininho que dizia

“Fessora, eu posso ir lá fora?”
Mas apenas ficava um momento
Bebendo o vento azul...
Agora não preciso pedir licença a ninguém.
Mesmo porque não existe paisagem lá fora:
Somente cimento.
O vento não mais me fareja a face como um cão amigo...
Mas o azul irreversível persiste em meus olhos.

Tudo cimento. Prédios monstruosos arranha-céus, bem diferente do monstro com vinte janelas e uma boca que cuspia crianças na hora da saída, descritos pela professora Clarissa no romance. E não porque apenas não sou mais criança, nem os universitários o podem ser, mas a arquitetura mudou. Tudo mudou, e se fosse só essa a mudança tanto fazia...
As relações são mais frias. Como no poema de Quintana não é necessário pedir licença – um sinal notório de educação – para sair da sala, posso inclusive não só beber o ar lá fora, como ir embora e deixar o professor a ver navios como se ele fosse uma coisa qualquer. Muitos dizem: o importante é pagar a mensalidade. Os bolsistas dizem: Pago os impostos! O mesmo é dito por universitários de instituições federais.
Gabriel Chalita, renomado educador, descreve três características fundamentais aos professores: competência, coragem e amor. Mas aqui me interessa sua definição de competência, presente no livro Pedagogia da Amizade:

“Não é possível ensinar sem aprender. O mestre é aquele que aprende o tempo todo, que estuda, que busca ampliar o repertório em respeito à confiança que o aluno deposita nele. A competência deve levar em consideração o conteúdo e a forma. Há que se perguntar àquele que se propões a ensinar o que é de fato essencial para que o aluno siga a sua jornada. (...) Competência não deve ser sinônimo de prepotência e arrogância. Ao contrário. O professor competente tem a simplicidade de buscar o que há de melhor para partilhar com os alunos. Sabe que não basta ensinar somente o conteúdo da disciplina. Sabe que é preciso ter um olhar ampliado. Dialogal. (...) A interdisciplinaridade ou transdisciplinaridade precisa sair do gabinete de teóricos e chegar à sala de aula. (...)”  

Aprender o tempo todo, não ser prepotente ou arrogante e dialogar. Eis o mistério, o segredo que tão poucos apreendem; uma porção reduzida a têm por completo, outros têm em parte, outros sequer sabem do que se trata, contando que recebam o salário percentual das mensalidades ao final do mês!
Claro que nos lugares mais inóspitos sempre é possível encontrar uma fonte, um manancial... Algo que represente de longe um conforto. A estes os acomodados estranham e dão apelidos, por que fogem do comum, são encantadores num ambiente onde o encanto é a extrema exceção e não a regra geral. Tão bom quando em meio ao concreto aparece alguém e diz: “suave?”
Não, suavidade é o que não há. Por quê? Eis a questão! Acaso esses mestres não foram crianças, e não tiveram professores? Acaso estes significaram tão pouco assim? Não na geração em que foram formados. Atualmente é escandalosamente natural ver alunos revoltosos contra professores, se sentindo cheios de razão. Não na época em que meus professores de todos os tempos se formaram.
Ser professor é uma benção, seja de crianças, adolescentes, jovens ou adultos. Ser professor não é só repetir teorias, forçar alunos a decorá-las, dar uma nota e pronto! Está acabado. Não! Se os alunos são crianças o preparo é um, adolescentes outro, jovens idem, adultos também.
Certa vez ouvi dizer que as escolas a distância são o futuro. Talvez sim. Lamentavelmente o ser humano cria as coisas para sua própria danação! Pela completa incapacidade de manter firmes e saudáveis os contatos sociais, o destino das escolas será um simples computador... Se pessoalmente não podemos tirar dúvidas de uma forma completa como com o Google, danem-se os professores! Que eles sirvam apenas para aplicar minha avaliação e nada mais, até que inventem um robô que o faça. (Continua)





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