Meu
objetivo neste post é desconstruir a verdade de David Gale, não para impor a
minha, estejam livres para desconstruí-la se quiserem. Não existe a minha
verdade, aliás, uma questão que me vem à cabeça é: será que Alan Parker, ao
construir esse enredo teve consciência de todos os vieses do seu personagem?
Será que ele acreditava que construia um personagem que lutava por um ideal e
não pela sua própria honra? Será?
Bitsy,
cada vez mais envolvida com o drama do professor, começa a querer provar sua inocência
a tempo de salvá-lo, ela não sabia que sua intenção com a entrevista não era
essa. Desesperada ela aposta suas fichas na culpa de Dusty, começa ela a
persegui-lo e descobre que era ele quem lhe deixava as fitas. Enquanto isto,
Gale, cultivava um ar de certa satisfação pela sua situação, narrava sua vida à
repórter com um tom melodramático, para que Bitsy se sensibilizasse pelo fato e
reproduzisse posteriormente os seus objetivos.
A
esta altura o filme mostra a movimentação popular em torno do fato, uns
sedentos pela morte do professor, sem o menor juízo do fato, outros protestando
contra a pena de morte, tais quais como os primeiros. Bitsy entre todos, era
quem possuia alguma informação sobre o assunto, mesmo assim, sua emoção não a
deixou racionalizar o fato, e sua luta pela absolvição do professor – justa, já
que de fato David Gale era "inocente", embora cúmplice do suicídio da amiga – passou
a ser a sua meta principal.
Assim
a repórter se tornou um fantoche nas mãos de Gale, fazendo passo a passo exatamente
o que ele queria que ela fizesse, e sentindo o que ele queria que ela
sentisse. Não só ela como todos nós. Imaginemos
como essa personagem “sofreu” tentando salvar o professor da morte, tentando
montar o quebra-cabeça. Agora, quão frio foi David Gale, ao
manipular a jornalista só por causa dos seus brios. No momento que assisti ao
filme não pensei nisto, a ideia me pareceu genial, afinal ele era o inocente
que morreria pelo sistema.
Porém,
David não foi condenado sem provas, ele gerou as provas. Gale e Constance transaram
antes de sua morte, logo havia sêmen do acusado na vítima, além dos agravantes
mencionados, que era o seu artigo sobre o tipo de morte, mais seus antecedentes
com Berlin. Quantos que supostamente morreram inocentes, como afirmava o
professor, deixaram tais provas na cena do crime? Na verdade tudo que ele não
fez foi assassiná-la com as próprias mãos, o resto foi um ardil sórdido. Ambos
aplicaram a pena de morte a si próprios, para provar que a pena de morte não
era justa.
Repleto
de paradoxos, o enredo chega ao fim, enquanto Bitsy corre feito uma louca para
chegar a tempo no local da execução, Gale vai com um semblante sarcástico para
seu banho antes da hora final. Para amarrar a ideia de que o protagonista era
um herói, é mostrado que o dinheiro recebido pela entrevista foi destinado à
seu filho. Que pai atencioso! Ele queria mostrar para seu filho que ele, e nada
além dele, era um bom homem.
Quando
Bitsy chega ao local, já era tarde, o povo já comemorava e outros lamentavam
sua morte. A prova que ela tinha até então era parte da fita que mostrava a
morte da professora. Frustrada a repórter chorou. Choraria mais ainda quando
depois de limpar a imagem de David Gale perante a sociedade, ao publicar a matéria
com sua vida, ela receberia a fita integral da morte, desde o início, onde
aparecia a professora instalando a câmera, fazendo sozinha todos os passos de sua tortura, em seguida Dusty indo confirmar sua morte, e por fim o próprio
David Gale aparece em cena, para mostrar que ele sabia de tudo e forjou tudo
aquilo de que ela achava que ele estava sendo acusado injustamente.
Talvez,
se Bitsy tivesse tido acesso a fita integral antes de sua execução, ela mesmo
iria matá-lo, só de raiva. Ele não era inocente, a justiça agiu correto, pois
havia as provas, e ele era culpado pelos atos praticados, ele aceitou friamente a morte de sua melhor amiga, para limpar sua honra. Pouco importa se ambos estavam sem perspectivas de vida, eles se mataram sem culpa por crime algum a priori. Não apareceu o interesse pela causa, apenas por ele próprio. Gale se colocou
naquela situação, a ordem dos fatores, para mim, não altera o produto.
O filme falava ou não APENAS da vida de David Gale?
Excelente observação. Só não concordo contigo quanto à possivel mudança de enfoque. Vc diz que ele passou a defender a própria honra em detrimento do objetivo maior que era mostrar a falha do sistema em casos de pena de morte. Não acho que ele mudou o enfoque. Apenas utilizou desse argumento sobre a honra, preocupação com o que seu filho iria pensar etc, para motivar a reporter. Pois no que dependesse apenas da motivação da luta pela pena de morte poderia esbarrar num conceito individual da da moça que não necessariamente seria a favor. Poderia não despertar tamanha emoção. No mais concordo com tudo, especialmente no que diz respeito à produção de provas. De fato ele as produziu e se colocou na cena do crime. Na melhor das hipóteses ele teria estado na cena do crime, alterando-a. Não tendo sido ele o autor, poderia ter sido cúmplice de um possível homicídio. Sem dúvidas muitos irão interpretar o filme apenas pelo vies de um eventual heroísmo por parte daquele que teria dado a vida para mostrar que o sistema é falho. E realmente o sistema é falho. Mas, a rigor, não falhou no caso dele, embora o resultado final tenha sido comprometedor para o Estado. Para que o juízo de valor seja favorável a ele considerando o enredo do filme, a Constance teria que ter tido o ânimo de vontade de colocá-lo na cena do crime sem que ele soubesse, mas não foi o caso.
ResponderExcluirObrigada pela participação!
ResponderExcluirEmbora eu continue acreditando que ele perdeu o rumo da prosa no meio do enredo... Gale pode não ter feito propositalmente, mas no final, vemos um homem obsessivo para que as coisas saiam do seu jeito, subvertendo o sistema para mostrar que os sistema é subversivo.De qualquer modo, esse filme é muito bom, pois dá o que pensar sobre nossas paixões por determinadas causas e pessoas, e o que realmente nos motiva.
Apesar de não concordar, gostei do seu ponto de vista!
ResponderExcluirO sistema é falho, melhor 100 criminosos na rua, do que 1 inocente preso e, ainda, morto.
Espetacular e minicuosa foi observação do filme por completo feito pela Camila, e muito interessante a abordagem feito pelo "anônimo" revelando uma perspectiva paterna que limpa a imagem perante seu ente mais querido.
ResponderExcluirParabéns, deveria fazer mais posts com filmes renomados. Sugiro ver a famosa lista de 40 filmes com desfechos surpreendentes da revista Super, certamente alguns finais complexos e inusitados merecem uma avaliação tão digna como esta.
Ótima ideia Will! Vou pensar sobre isso! Obrigada pelas suas observações!
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