sexta-feira, 16 de abril de 2010

Pego de Surpresa II


Nem sabes como foi naquele dia...   

Nem sabes como foi naquele dia...
Uma reunião em suma tão vulgar!
Tu caístes em estado de posia          
Quando o Sr. Prefeito ia falar...

O mal sagrado! que remédio havia?
E como para nunca mais voltar,
Lá te foste na tarde de elegia,
Por essas ruas a perambular.

Paraste enfim junto a um salgueiro doente,
Um salgueiro que espiava sobre o rio
A primeira estrelinha... E, longamente,


Também ficaste à espera (quanta ânsia!)...
Mas a estrelinha, como um sonho, abriu,
Longe, no céu azul da tua infância!


Mario Quintana




Quanta delicadeza: "Estado de poesia", nada mais adequado!



Quem leu o post anterior e me conhece deve estar dizendo: "Veja só quem fala! Marginalizou-se!" Não pelo meu estado de poesia caro amigo, que este eu tiro de letra, quem me conhece, melhor ainda, sabe.

Machado de Assis descreve, em Memórias Póstumas de Brás Cubas, uma situação tão prosaica aos "poetas", que no entanto assustam os "normais": "Ora, enquanto eu pensava naquela gente, iam-me as pernas levando, ruas abaixo, de modo que insensivelmente me achei à porta do hotel Pharoux. De costume jantava aí; mas não tendo deliberadamente andado, nenhum merecimento da ação me cabe, e sim às pernas que a fizeram."

Situação que eu poetizei de modo menos brilhante no trecho que segue: "Me assusta em movimentos circulares, sair de mim e me achar n'outros lugares..." Tanto no poema de Quintana, quanto no texto de Machado de Assis (e no meu modesto versinho) não é mencionada cenas grotescas de acidentes, ou coisas terríveis que alguns ainda acreditam que pode ocorrer aos epiléticos se andarem sozinhos na rua. Pelo menos não existe nenhum risco que qualquer outra pessoa também não sofra.

-"Mas e daí?"- perguntam-me. Quintana também disse: "O pior dos problemas da gente é que ninguém tem nada com isso!" Eu poderia culpar o Papa, o Lula (este sempre tem alguma culpa!), minha mãe, o Abreu (não pergunte qual...), até o Mário (que não é o Quintana.). Mas tudo se volta para mim, como os olhares de quem lê isto agora. Você, que talvez esteja me criticando: "Para de falar de doença!" Não estou falando de doença! Todos temos nossas esquisitisses, a diferença é que Hipócrates (460-377 a.C, aquele de Tessália -) cadastrou a minha no conselho de medicina, portanto ela tem um nome, virou um diagnóstico.

Você também tem as suas esquisitisses que eu sei! Qual é? Fala sozinho? Lambe os beiços enquanto escreve? Fala dormindo, ou é sonâmbulo? Olha que coisa, sonâmbulos também andam inconscientes e ninguém dá apelidinhos idiotas à eles, ou os privam de qualquer coisa! Isso é discriminação! Vou exigir cotas pra epiléticos nas universidades! Tem cota pra tudo mesmo... brincadeirinha politicamente incorreta...

Não soa melhor, saber que tudo pode se reverter, do que o que a medicina comum diz, que é uma doença crônica e sem cura?

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