sexta-feira, 16 de abril de 2010

Pego de Surpresa... Ou epilepsia.

"Sim eu tenho a doença das quedas, a qual não é vergonha pra ninguém. E a doença das quedas não impede a vida". Dostoiévski




O que é epilepsia creio que todos saibam, ou tem uma ideia do que seja. Pelo menos eu conheço poucas pessoas que não tenham um outro conhecido com o mesmo problema. Há estudos que indicam que a cada 100 pessoas uma tem epilepsia, logo é bastante comum, no entanto o preconceito é tão grande! Aliás se eu for falar em preconceito vou entediar o leitor, porque este assunto vai beirar na hipocrisia da humanidade.


De mal-sagrado a mal demoníaco  tudo se fez contra os epiléticos desde os tempos mais remotos. Hoje evita-se jogá-los na fogueira como no tempo da inquisição, não é politicamente correto. Hoje marginalizam-nos, quando os próprios não o fazem por si! No entanto não é um bicho-de-sete-cabeças, é mais fácil do que se imagina conviver com algumas crises, as mais comuns como as ausências e crises parciais simples e complexas por exemplo, quando não há presença de convulsões.


Machado de Assis, nosso grande literato fundador da cadeira número 23 da ABL(Acadêmia Brasileira de Letras) era portador de epilepsia, no entanto escondia isto de todos pois sentia vergonha, poucas pessoas assistiram suas crises, segundo consta em suas biografias. Nada o impediu, contudo de trabalhar (vendia relógios na rua quando jovem),estudar, nem exercer magistralmente sua carreira de escritor, de livros e crõnicas que publicava nos jornais. Acho que sua obra foi a única coisa verdadeiramente crônica na vida de Machado.

Não consta em nenhuma fonte que Joaquim Maria M. de Assis tenha se privado do que quer que seja por ser epilético. Acho esta afirmação tão fúnebre: "Você é epilético!" Não! Prefiro: "Estou epilético". Também não gosto do termo "doença crônica". Quem sabe o dia de amanhã?  
Existem muitas personalidades que fizeram história, como o imperador Dom Pedro I, que passou a ter crises aos 18 anos. Imaginem se tivessem impedido o menino de andar a cavalo por causa das crises? Quão estranha não ficaria a cena do Grito do Ipiranga? Não teriamos sequer o "dia do fico", anterior a independência - "Se é para o bem de todos e felicidade geral da Nação: Digam ao povo que fico em Portugal mesmo porque sou doente!" Valha-me Deus!


Agora pensem no Rock sem a guitarra de Eric Clapton? Viajar em turnês, ensaios com a banda... Nada disso seria possível se ele se limitasse pela doença (que eu, como Machado de Assis não gosto de chamar assim).Voltando a literatura, tantos outros nomes podem ser citados Dostoiévsk (escritor russo) Agatha Christie, Lord Byron (poeta inglês).


Alexandre não seria nem médio que dirá Grande! Napoleão que dominou a França por 16 anos, estaria isolado na ilha de Córsega. "O Lago dos Cisnes" não teria a brilhante cançâo de Tchaikovsky . Enfim, não é muito difícil  imaginar como a história seria diferente se todos os epiléticos fossem marginalizados. Aliás se todas as pessoas com qualquer tipo de deficiência fossem marginalizadas, pessoas que não são "normais" como dizem.(Gostei de figurar em meio a estas "celebridades" todas!)



Post Scriptum:É engraçado, eu que sofro minhas ausências mas o povo que tem visão distorcida da coisa. Primeiro fazem um dramalhão mexicano que Deus me livre! Depois agem como se eu fosse surda... Falam de mim, quando estou nesta condição e ignoram que a crise dura segundos às vezes, mesmo quando dura mais, existe uma tal de memória que registra certos fatos, pra ilustrar darei um exemplo: Você já se pegou meio sonolento e ao mesmo tempo ouvindo o que as pessoas falam ao redor? Você não participa da conversa, está mais pra lá do que pra cá, mas quando enfim desperta, se lembra do que foi dito? Pois é, cuidado com o que dizem pessoal, muito cuidado!

(Continua)



2 comentários:

  1. Olá

    Sei de seu sofrimento. Fui epiléptico dos 13 aos 27 anos. Fiz um longo tratamento durante seis anos e fiquei curado. A medicação era fortíssima e até hoje parece que sinto resquícios do remédio, que me fazia sentir naúseas de tudo, de cheiros, sabores. Quando tinha crises, as tinha durante o sono, o que de certo modo me preservava do apartheid que ocorre nestes casos. Grande culpa do preconceito é associado, acredito, à folclorização, ao lado místico que carrega a doença, à simbologia fantasiosa que traz consigo. Epislepsia significa 'ser arrebatado de cima' ou seja, na própria palavra há uma etimologia fantástica, que na realidade é bem humana.
    Abraços e tudo de bom.

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