terça-feira, 23 de junho de 2020

A Hora da Virada


Dizem que o número sete é um número completo. Deus descansou no sétimo dia da criação. Dizem que de sete em sete anos é um momento propício para grandes mudanças, a hora da virada. Vim na estrada de volta para casa, certo dia, refletindo sobre isso e admirando a paisagem ao redor.

A primeira imagem que me chamou atenção foram as flores amarelas, parecidas com margaridas, enfeitando a beira de um córrego. Por um longo percurso do rio de esgoto havia belas margaridas amarelas penduradas. Que poética aquela imagem. As flores colorindo a paisagem fétida. Inocentes. Elas não tinham culpa da degeneração dos resíduos ao seu redor. Elas nasceram para ser flor, e flores estavam sendo.

Margarida. O nome da minha mãe. Sem dúvidas margaridas são resistentes a insalubridade de qualquer ambiente. Longevas. Não são tão lindas quanto as rosas ou as orquídeas, mas, menos sensíveis são mais fáceis de cultivar. Exigem menos cuidados e renascem a cada estação sem que a gente precise fazer caso delas. Elas estão sempre lá, adornando qualquer espaço onde sua semente foi lançada. Sem elas o ambiente seria feio e sem importância. Com elas tudo parece muito indigno de sua presença. Nenhum saneamento satisfaz.

Depois das margaridas a beira do rio, vi um Ypê Rosa, florido em meio a estrada, cercado por palmeiras. Mais a frente vi um bambuzal desmatado e senti meu semblante entristecer. Que estranho perceber aquele percurso diário como se fosse a primeira vez! Depois de mais alguns minutos de mata fechada, anoiteceu e adormeci de cansada no ônibus fretado.

Percebi que estava vivendo mais um ciclo de sete anos da minha vida. Era hora de mudanças. Mas mudar como? O que? Meus sonhos tinha deixado para trás, e de repente era como se eu estivesse voltando atrás e recolhendo-os pelo caminho. É como se cada árvore ou flor notada na estrada, fosse algo importante que eu deixei passar descuidada, mas que ficaram lá a me esperar.

“Está sempre acontecendo algo”. Disse-me alguém, ou será que foi a voz do meu coração? Sempre acontece algo, nós que nos distraímos... vemos TV demais e olhamos menos nos olhos. Sentimos menos, abraçamos menos. Pisamos muito nos sapatos e menos no chão. Olhamos muito e não vemos nada. A natureza cura. Ela nos ajuda a reorganizar a mente, e com a mente minimamente sã, todo o resto se recupera melhor.

Mas como é desafiador manter a mente sã! Mas é possível. É belo olhar o passado e encontrar ternura, caridade, afetos, amores, alegrias. Saber que tristezas foram superadas, outras deixaram marcas, e outras ficaram escondidas ali por tanto tempo, e ainda doía! A dor precisa ser doída. Nunca fui adepta de curas miraculosas, como se fosse errado sofrer ou chorar, machucar ou morrer. Tudo tem um porquê. Aflições fazem parte, só precisamos manter o bom ânimo para vencer, sem deixar de caminhar. Não se vive de passado, mas o futuro não existe se não for construído pelo presente que passa.


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